Eu corri até meus pés criarem calos. Corri tanto, durante tanto tempo, que perdi o foco. Fui adiando, sempre depois: depois que eu acabar, depois que eu começar, depois que tudo se acalmar, depois que eu encontrar, depois de tudo se ajeitar. Mas o depois nunca chegou. E me dei conta disto hoje, quando acordei com tempo feio e acabei passando a manhã em casa, aparando frases, palavras, pensando, ordenando. Agora tá acabando, falta pouco, bem pouco. E um depois está prestes a chegar. E agora? Perder o ponto de novo?
Me escondo no tempo. Não inventei muitas histórias porque nunca ficaram muito boas. Amei os que foram de outras, nunca meus, porque assim as críticas a mim seriam menores. Não li tudo que gosto, porque nunca me senti preparada. Deixei o mehor pedaço pro final, sem mesmo saber se ia alcança-lo.
Mas hoje, hoje aconteceu uma coisa diferente. Hoje eu não quis deixar pra depois. Hoje eu decidi, me forcei. E foi bom, quero que seja. Quero não me arrepender e não deixar mais o tempo passar. Sem adiar coisas boas, sem achar que preciso me torturar antes. Afinal, eu mereço, de verdade, do fundo da minha vontade.
Sem mais falsas Lucianas para agradar aos outros e esquecer de agradar a ela mesma. Sem mais estudos que não me façam ficar feliz, sem mais músicas de gosto alheio, sem mais me esforçar para não errar, sem mais medir palavras para parecer forte. Sem mais virtualidades, porque, agora, vou viver o real, o paupável, o possível de ferir e ver o sangue.
Tudo vai crescer melhor e vou escutar músicas chorosas de pés no chão, na minha casa nova e com cheiro de flor. Vou deixar o sol bater no meio da cama pra me acordar com cosquinhas nos olhos. Vou pintar as paredes de claro e pindurar fotos.
Vou continuar almoçando sozinha, rindo internamente das conversas alheias, comendo sushi com feijão e tomando água com limão, “sem gelo, tá?”. Vou terminar os contos, tirar o pó do computador, desempilhar os livros, escutar as traduções, aumentar minha biblioteca. Vou continuar trocando letras e me achando ignorante frente a muitas coisas. Mas vai ser eu.
Só eu, ninguém mais.